sábado, 22 de junho de 2013

INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. ESSA É A SAÍDA?!




Por Jorge Roberto Fragoso Lins*


No dia 21 de janeiro de 2013 foram realizadas as primeiras internações compulsórias dos dependentes químicos da Cracolândia. Entre os agentes incumbidos de realizá-las estavam: os profissionais da saúde, do Ministério Público, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). As ações visavam à internação involuntária dos dependentes em crack e desvelava como principal discurso o tratamento dos usuários que já estavam quase aniquilados pela droga, ou seja, pessoas extremamente desnutridas que estavam à mercê de todas as doenças intercorrentes e que acabavam indo a óbito. Aproximadamente um mês depois, a mídia veiculava a notícia de uma nova Cracolândia a 300 metros de onde ficava a anterior, ressoando o que já era previsível, o fracasso da ação. Quando se tangencia uma situação de risco iminente de extrema debilidade não contestamos que em prol de salvaguardar a vida e o bem-estar do indivíduo sejam tomadas medidas mais efetivas de tratamento. Porém, não se concebe qualquer tipo de intervenção clínica sem a aquiescência do usuário de se submeter ao tratamento, caso contrário qualquer ação da ordem será infrutífera. Qualquer que seja a droga e o acentuado nível de dependência que se encontre o sujeito, acreditar no êxito de uma internação compulsória é ter uma compreensão no mínimo pueril do problema. Manter abstinência da droga já é difícil quando se luta para  deixá-la, quanto mais quando não possui tal desejo. O crack é uma droga pesada, porém extremamente acessível à população de rua. No entanto, traçando um perfil quantitativo entre dependentes de crack e de álcool, o segundo ganha facilmente. Nem por isso se traça uma campanha massissa contra o álcool. Muito pelo contrário, não faltam propagandas publicitárias de cerveja sendo veiculadas em horário nobre da televisão e em outros veículos de comunicação. O álcool é tão grave como qualquer outra substância psicoativa, podendo levar o usuário ao suicídio, a uma cirrose hepática, a mortes no trânsito, e como um reagente a mais para os crimes passionais, etc. 


Acompanhando a forma arbitrária de como essas pessoas foram retiradas da Cracolândia, não podemos deixar de nos reportarmos a uma época histórica de nosso país, precisamente, a da República Velha, com a antiga polícia sanitária, que invadiam as casas das pessoas e sem a permissão da população aplicavam a vacina contra a varíola. A maneira de como era realizada a vacinação gerou um grande repúdio da população que considerava tal comportamento uma tirania. Insatisfeita, a população saiu às ruas e assim deu início a Revolta da Vacina, colocando a cidade do Rio de Janeiro em estado de sítio. A revolta deixou um saldo de 30 mortes, 110 feridos e 945 presos, das quais 461 pessoas foram deportadas para o Acre, implicando, também, o afastamento de Oswaldo Cruz de suas funções. Logicamente, não contestamos a eficácia e a necessidade de se vacinar a população, mas sim a maneira de como foi realiza. Comparativamente, algo de arbitrário ocorreu no caso da Cracolândia. Haveria uma falta de saber por parte da equipe de saúde que ação não surtiria o efeito desejado? Resta-nos então, saber, se existiu a intenção de tratamento ou de apenas “higienizar” a cidade, retirando, tiranicamente, os usuários das ruas e assim, ocultando daqueles que não querem ver ou dos visitantes a realidade que vive os oprimidos no país. 


* Jorge Roberto Fragoso Lins é Sociólogo e pós-graduado em intervenções clínicas em psicanálise, graduando do 8º período de psicologia.



Artigo publicado no Jornal Diario de Pernambuco na edição de 19/06/2013  

Disponível também no portal enfrente o crack. Conselho de Medicina do Brasil:  
http://www.enfrenteocrack.org.br/

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